Sobre o que conta Num
Sobre o que conta
Num post recente, o Abrupto sugeriu, "aos amorosos da blogosfera" (e como quem quer ser lobo/a, deve decididamente vestir a dita pele, ainda por cima uma das mais belas - os ecologistas que perdoem o politicamento incorrecto da apreciação..), a leitura de um livro,The Anatomy of Melancholy, de Robert Burton; aproveitando o link, consultei a edição em linha e achei, de facto, pela amostra (ler, ler mesmo, só em papel me dá gosto, ai de mim!), que se trata de uma verdadeira obra de referência, erudita e densa de modo a deliciar quem desejar uma visão profunda. Espero conseguir um exemplar, e depois volto ao assunto.
Entretanto, há alguns pontos de vista sobre o amor (sem perder de vista que existe um fundo de mistério inviolável), de natureza bem diversa, expurgados de densificação filosófica, que também me parecem merecedores de reflexão.
Em primeiro lugar, e ao arrepio do pensamento romântico acarinhado há cerca de duzentos anos no seio da cultura ocidental, não creio que o amor seja um deslumbramento, uma "cegueira", um flash que, do nada, aproxima duas "almas gémeas" que se encontravam separadas e enfim se reunem; por outras palavras, o amor pouco ou nada tem a ver com o que se designa por paixão (palavra também conotada com sofrimento, o que não é certamente por acaso). O amor é uma energia, uma força de expansão, criada e desenvolvida por efeito da vontade, com persistência, esforço, focus; por isso a perseverança é uma das suas condições sine qua non. Mas não é uma teimosia, uma determinação irracional: só é amor quando há uma construção, um desenvolvimento em espiralde quem ama. Por outro lado, o amor por alguém nunca pode suprimir o nosso amor próprio, no sentido em que só poderemos amar os outros se nos dignificarmos no processo.
Ana Roque
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Publicado em 14 de Agosto de 2003