Mágoas desnecessárias (ou a
Mágoas desnecessárias
(ou a porta secreta)
Saber avaliar, com rigorosa precisão, a verdadeira natureza da mágoa que nos invade, esse contragosto, travo amargo como inócua cicuta a macerar os dias. Não lhe dar espaço imerecido se é apenas uma pequena onda em maré vaza, um mau hábito simplesmente reactivo à falta do que se deseja. Deixar que as coisas sejam placidamente o que são, sem teimar em elevá-las a olimpos improváveis onde não podem chegar sem asas. Não pedir a graça do Verbo onde ele não pode ressoar nunca. Lembrar que a "linguagem é o eixo e o instrumento de definição da nossa humanidade, do nosso lugar no mundo", e aceitar com dignidade que cada um legende a sua vida e o que nela ocorre como bem quer, sem que isso nos afecte. Encontrar a porta secreta para a saída do impossível; ela está lá, algures no fundo recanto de nós próprios.
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Publicado em 9 de Dezembro de 2003