É curioso como a agitação é viciante. Mesmo quando, por fim, não há qualquer razão de queixa, quando a gratificação é evidente e a reciprocidade amorosa inegável, pode surgir uma tendência perversa para a perturbação - no limite, pode até ser um lamento sobre a felicidade em overdose. Os velhos hábitos perduram para além do razoável, os vícios de atitude deixam finos rastos negros na brancura das noites a que nunca pertenceram. Quando se viveu muito para além da própria resistência, fica um desgaste que não se repõe com facilidade, ainda que a energia esteja disponível, generosa e densa, mesmo ao lado. Aprender e apreender a serenidade não é imediato nem se atinge sem sobressaltos de alma. Há dores fantasma que ainda percorrem os corredores sombrios da memória, há medos que se calam a custo, há apostas que se temem de tão plenas. Resta respirar fundo, procurar as palavras exactas e justas, banir as que invadem em excesso inútil, remeter o susto para parte incerta. Para longe, ou perto disso.