(gentileza de Amélia Pais) O desconhecido que passa e te acha ainda digna de uma fugidia palavra de desejo, Talvez porque na sombra da noite tão doce de Maio Ainda resplendem teus olhos, ainda tem vinte anos a ligeira figura deslizante, Não sabe que foste amada, por aquele que amaste amada, em plena e soberba delícia de amor, E em ti não há membro nem ponta de carne ou átomo de alma que não tenha uma marca de amor. Que tu viveste apenas para amar aquele que te amava, E nem que quisesses podias arrancar de ti essa veste que o amor teceu. Ele, ignaro, em ti já não bela, em ti já não jovem, saúda a graça do deus: Respira, passando, em ti já não bela, em ti já não jovem, o aroma precioso do deus: Só porque o levas contigo, doce relíquia à sombra de um sacrário. Ada Negri (1870-1945), in Poesia do Século XX, trad. de Jorge de Sena.