O inútil luar É noite. A Lua, ardente e terna, Verte na solidão sombria A sua imensa, a sua eterna Melancolia . . . Dormem as sombras na alameda Ao longo do ermo Piabanha. E dele um ruído vem de seda Que se amarfanha . . . No largo, sob os jambolanos, Procuro a sombra embalsamada. (Noite, consolo dos humanos! Sombra sagrada!) Um velho senta-se ao meu lado. Medita. Há no seu rosto uma ânsia . . . Talvez se lembre aqui, coitado! De sua infância. Ei-lo que saca de um papel . . . Dobra-o direito, ajusta as pontas, E pensativo, a olhar o anel, Faz umas contas . . . Com outro moço que se cala, Fala um de compleição raquítica. Presto atenção ao que ele fala: — É de política. Adiante uma senhora magra, Em ampla charpa que a modela, Lembra uma estátua de Tanagra. E, junto dela, Outra a entretém, a conversar: — "Mamãe não avisou se vinha. Se ela vier, mando matar Uma galinha." E embalde a Lua, ardente e terna, Verte na solidão sombria A sua imensa, a sua eterna Melancolia . . . Manuel Bandeira