Gosto de ti como se gosta do sol, e era bom ficar ao sol todo o dia, mas queima. Muitos outros se deitam ao sol, toda a espécie de corpos, não tens tamanho para tanta gente. Um dia vai-se abrir a porta doirada, vamos caber, um a um. Vais-me escolher especialmente, como todos os outros. Podes ter mãos. Podias até, alguma vez, ter lábios, dizer alguma coisa em língua, numa língua qualquer. Naturalmente, a imaginação poética é só devaneio, tilintar de talheres sem nada para comer, um ar tão leve, para que serve respirar? Para esquecer, escrevo um longo romance verdadeiro e pícaro; tudo nele é real!, as pessoas dormem e acordam e dormem, e fodem nos intervalos; devoram-se animais; mas o melhor são os diálogos. Entre existires e não existires antes não existires, é mais inteiro, deixa menos dúvidas dentro do crânio, ao lado dos ossos normais. Entre mulher e homem o melhor é não teres mesmo por onde escolher, vestir saia-casaco ou fato completo, usar até, em dias de festa, as tuas peles virtuais. António Franco Alexandre