Ao declinar da tarde chego à cabana velha de muitas gerações. O silêncio deixa-me respirar. As paredes ainda são as mesmas. Grandes manchas de humidade, a luz de astros distantes, a presença de pássaros desconhecidos. Os meus pensamentos que iniciam a ronda das sombras. Era um dia era uma hora propícia de repousos, de vozes como antigamente. Coisas construídas e eu estou aqui ladrar de cães entre as árvores. Eu vejo mais do que a luz, as linhas leves dos montes. Desce neles o perfil divino da terra molhada. As estações na ombreira da porta Raramente lembramos os lugares como um livro que se abre Horizonte já inacessível. O primo pequeno o calção sujo de terra Fotografias pacientemente dispostas sobre a mesa de madeira Sem detença me abandono Veredas perfumadas flores voando pulsa lento o sangue junto ao esqueleto Neste chão vos imagino calados como outrora vida sem desenlace o fogo que se desenrola amei em vós o fulgor do coaxar das rãs o alfabeto sensível do que a escuridão me dizia. Devagar. Deus dá-se por satisfeito espreguiça-se no sereno entardecer. Devagar digo de mim para mim Longa criatura arfando na terra nas horas que passam. Abro a porta, aguardo a quietude abro a saída uma chuva mais frágil entre duas águas que se reúnem. Gérard Calandre, trad. Nicolau Saião