É de ti que eu sou irmã por ti fui trocada em criança quando as estrelas semearam a noite (Ficávamos chorando de medo se o laço branco da trança não desse para a escuridão toda do quarto) Tenho os silêncios que me emprestaste e na cidade que levantámos há pouco (não destruiremos nunca) habitam os pais com os não irmãos mortos à nascença que o eco de um flauta eternizou no cais dos barcos pequenos de papel somos irmãos de ninguém ancorámos com amarras de dúvida é nosso irmão o medo do poente a porta azul da morte Em redor em redor de nós a solidão voou borboleta negra de metal caiu enforcado público na gravata verde (a mesma solidão que cega os arcos concêntricos das pupilas) desde a rua ao bolor dos corpos poetas da porta esquecida sem número à mulher vendida aos ventos da noite sem nevoeiros asfixiamos nítidos nos passeios nos fatos nas cadeiras nas cúpulas nos clarins e sentes contigo os corpos das mulheres de bruços sobre o dia renascidos maduros os limites da carne Há nebulosas de anos sem sentido que vimos aprendendo o amor há um embrião de veia há uma veia atávica vermelha nos mil séculos anteriores ao homem Quando nos será possível um suicídio exacto em casas impossíveis em ondas impossíveis em (integralmente areia) desertos impossíveis? Nasceu o sol na erva a erva nos degraus os degraus desceram ao horizonte Luiza Neto Jorge