Chegava um dia ao tempo da monção. No alto das figueiras cheirava-se o mar e o vento trazia o barulho das suas ondas a rebentar nas rochas em punhados de rendas brancas ainda por bordar. As falésias sopravam os fenos e as vinhas salgavam-se nos pingos da chuva trazida nas asas e nos gritos das gaivotas invisíveis. Não apetecia a correr, a desbravar os mistérios da terra por cultivar ou a subir aos galhos mais altos das papaieiras curvadas pelo ar convulso dos estios. Deitados no chão imaginávamos as brincadeiras desenhando nas nuvens as rotas pelos plantios. Chegadas as noites apurávamos os ouvidos ao piar das corujas e aos fogos fátuos nos montes com medo das feiticeiras e das bruxas dançando até se cansarem de folia à porta dos cemitérios ou saltando à fogueira nas encruzilhadas. Chegava um dia o tempo da monção. Se demorasse, como costumava demorar, o cerco dos temores era o mesmo debaixo da Lua cheia. E as histórias vinham em contas completas de rosário. Eram sempre inventadas. José António Gonçalves