(em memória de Amélia Pais, com o apoio de um leitor/autor muito especial) Só, incessante, um som de flauta chora, viúva, gracil, na escuridão tranquila. - Perdida voz que de entre as mais se exila, - Festões de som desimulando a hora Na orgia ao longe, que em clarões scintila e os labios, branca, do carmim desflora… Só, incessante, um som de flauta chora, Viúva, gracil, na escuridão tranquila… E a orchestra? E os beijos? Tudo a noite, fora, cauta, detem… Só modulada trila a flauta flebil… Quem ha-de remil-a? Quem sabe a dor que sem razão deplora? Só, incessante, um som de flauta chora… Quem poluiu, quem rasgou os meus lençoes de linho, Onde esperei morrer – meus tão castos lençoes? Do meu jardim exiguo os altos girasoes Quem foi que os arrancou e lançou no caminho? Quem quebrou (que furor cruel e simiesco!) A meza de eu cear, - taboa tosca de pinho? E me espalhou a lenha? E me entornou o vinho? - Da minha vinha o vinho acidulado e fresco… Oh! minha pobre mãe!... Não te erguas mais da cova. Olha a noite, olha o vento. Em ruina a casa nova. Dos meus ossos o lume a extinguir-se breve. Não venhas mais ao lar. Não vagabundes mais, Alma da minha mãe… Não andes mais á neve, De noite a mendigar ás portas dos casaes. Camillo Pessanha