Noite
Mas a noite ventosa, a noite límpida
que a lembrança somente aflorava, está longe,
é uma lembrança. Perdura uma calma de espanto,
feita também ela de folhas e de nada. Desse tempo
mais distante que as recordações apenas resta
um vago recordar.
As vezes volta à luz do dia,
na imóvel luz dos dias de Verão,
aquele espanto remoto.
Pela janela vazia
o menino olhava a noite nas colinas
frescas e negras, e espantava-se de as ver assim tão juntas:
vaga e límpida imobilidade. Entre a folhagem
que sussurrava na escuridão, apareciam as colinas
onde todas as coisas do dia, as ladeiras
e as árvores e os vinhedos, eram nítidas e mortas
e a vida era outra, de vento, de céu,
e de folhas e de coisa nenhuma.
Às vezes regressa
na imóvel calma do dia a recordação
daquele viver absorto, na luz assombrada.
Cesare Pavese, trad. Carlos Leite
Publicado em 21 de Maio de 2013