Quando a meia-noite começa a beber as almas, Quando os copos ganham fundo E para muita desta fauna nocturna O mundo parece mais próximo do fim, Eis chegada a hora de Jean-Claude; A hora escondida pelo dia inteiro, A hora de ajudar Maria, a bela de serviço, Nas últimas tarefas do bar antes do fecho. Não importa o que digam: Se é demência de velho, se é ridículo, Se é patético, se é risível, se é confrangedor. Deixar esses juízos para as vidas secas Que se comprazem nos aforismos sobre a solidão, Como há tanta e como é triste. Que lhes preste. Jean-Claude nada pede a Maria, Ou apenas, tacitamente, que se deixe amar um pouco. Maria nada oferece a Jean-Claude, Salvo um arisco e moreno deixar-se amar, Um deixar-se amar fugindo, como de ninfa. Este é um amor que merece muitos amigos. Todas as noites, à saída, alguém descobre uma lágrima No rosto de Jean-Claude, mais pura Do que um sapato de cristal numa escadaria. Nuno Rocha Morais