Many rivers to cross
Lembro que havia uma espécie de homem com uma espécie de raiva
naquela espécie de bairro
Lembro que o chão não era de escadas nem propício para patinagens,
lembro que havia filtros bastante esquisitos, ângulos estranhos, naquele filme
(não eram de Griffith nem Riefenstahl, mas exquisit quand même*)
do século sete depois de alguma coisa.
Não tinha propriamente um nome, que propriamente quisesse dizer
(preferia ser chamado em forma de contexto, “aquele que, o tal”)
aos que passavam, sobretudo aos mais contentes,
que o irritavam um pouco, e não por inveja.
Era assim uma espécie de homem assim dado
a todas as espécies de fortuna com que todos sonham
(espécie rara de europeu em milhões),
- uns quantos, poucos, para lá da pré-reforma.
Lembro que havia uma espécie de homem com uma espécie de raiva
naquele pouco engraçado labirinto.
Na sua crueza e falta de jeito para a espécie, amava os gatos e os cães,
que por seu turno o tratavam como um igual.
E ensaiava-lhes uns números de Eric Burdon, a atravessar rios
(it’s such a drag to be on your own, dizia-lhes, fazendo figas)
em direcção onde nem ele sabia.
Lembro que ria, no pior da piada;
como se no riso fosse a escada, o poço,
os filhos que não teve,
a dor no pescoço
(de não o dobrar)
e tantas e tantas
outras
conquistas.
Não foi à tropa, tinha umas inconveniências no sangue.
Saudável, morreu inteiro.
Até ao fim.
* Nasdrovia, nem mais nem menos
Rui A.
Publicado em 4 de Novembro de 2015