Nos dias sem mistério, nos dias sem sentido, convém ao espírito colocar umas quantas questões sobre a matéria: Não chega o dentro, não há viagem que apeteça, e das paredes escorrega uma anomia sueca (na distância, convenci-me que Durkheim era muito sueco; coisas). Talvez esteja frio mais lá fora, embora lá ver. Em mil novecentos e trinta e seis Magritte achou por bem deixar as maçãs de lado e ir ao caroço do tempo. Permitiu-se, no entretanto, deixar vidros no dentro (não voltaria àquele quarto senão as vezes que fossem mesmo necessárias); o que podemos considerar uma liberdade poética, um erro de análise, a sensata precaução com os pés de quem procura o fora no tempo (os vidros podem cortar, qualquer um deve saber). Ou não fazer caso, o que é sempre uma probabilidade. Lançou-se ao campo, e ponto Que se saiba, não mencionou nunca o sucedido, até ao fim dos seus dias, em mil novecentos e sessenta e sete, antes do Maio ao lado (nem sequer aos que lhe foram menos próximos). É portanto impossível saber do que então se passou, e se acaso teve o episódio alguma relevância (suspeita-se que não, mas com Magritte e as suas sombras nem a psicanálise se atreve). O vidraceiro agradecia esta espécie de tropelias, interessado, sem levantar questões. E Dona Rosa, essa santa senhora das migrações (que limpava os quartos e acomodava geometrias) nem sequer pestanejou. Rui A.