Em bicos de pés
Deixámos há muito de levantar os calcanhares
como os outros – cavalo, cão e tigre –
embora nos emocione a sua velocidade
ao fugirem. Até mesmo o rato
ao alancar o peso enorme de uma pepita
de ração para cães exibe uma elegância invejável.
A nossa passada tem pouca elasticidade,
andamos tão sobrecarregados de responsabilidade,
de todas as acções disciplinares
que nos couberam, os castigos,
as matanças, e todos com os pés
bem cingidos nas peles dos derrotados.
Mas por vezes, às primeiras horas da madrugada,
é-nos dado a sentir como teria sido
sermos um deles, em bicos de pés,
passando furtivos por portas onde outros dormem,
subitamente capazes de ver no escuro.
Ted Kooser, trad. Vasco Gato
Publicado em 25 de Janeiro de 2016