que eu não esqueça nunca
a luz que me ensinaste

a que ascendia do fundo
da tua antiga inocência
e transbordava
o espaço colocado
entre tuas coisas e as minhas

que nunca esqueça
certas palavras tuas
que falavam da tua gente
dos dias de cinema
do pai
da guerra
de duas mulheres sozinhas tanto tempo

é essa zona intacta da tua voz
onde não chego
tua presença e a minha
o mundo que respiras
o desse menino
sentado entre as pedras
atentos os seus olhos
ao brilho dos teus olhos

hoje a tua voz contida
une-me mais
às palavras que não percebo

a leve passagem da tua voz
fura o ar e vibra
expande-se
mais aquém da luz que antecede
o rosto dessa infância sem testemunhas

emudecia sempre quando menino

porém se tu falavas nascia outro silêncio

Ángel Campos Pámpano, trad. António Cândido Franco