Uma ficção, uma maqueta
manuseada de gato, brinquedo
posto de parte, algo que foi
trazido lá de fora:
o seu pêlo branco, hirto e cinzento,
a esgarçar-se pelas costuras.
Examino o focinho
de borracha deteriorada, uma orelha
corroída, o seu corpo amargo
amontoado como um pufe,
a verter-se em fio
sobre uma toalha deprimente.
Fico a observar a luz
a degradar-se nos seus olhos.

Tenta e falha
a subida para a sua cadeira, esgueira-se
para um canto da cozinha,
intimidado, desvirtuado, deixando de ser
algo de semelhante a um gato,
e eis uma nova expressão
naqueles olhos
que se recusam a cruzar-se com os meus
e trata-se da vergonha de ter sido
descoberto. Apenas isso.
E com essa
perda da face
a sua face, reparo,
tornou-se humana.

Robin Robertson, trad. Vasco Gato