Alzira, desde que me partiste
(bastante mais cedo do que queria e esperava, deixa que te diga), as
coisas ficaram mais apertadinhas, como se estivessem encolhidas.
Deixaste quilos de mágoa nesta parte, para lá de um orgulho ferido,
e enquanto te escrevo esta carta que não sei para onde mande, cresce uma
fúria que não te digo nem te conto (sei que pernoitas com o Jorge, esse boi); talvez
gostes de saber que deixei murchar as plantas da varanda, sobretudo as
hortênsias que deixaste sem qualquer espécie de delicadeza e consideração
(irrita-me essa falta de cuidado, foi mais uma forma de me dizeres que talvez
já não gostasses de mim).
Limpei a casa de quase todas as tuas tralhas,
mas não me desfiz dos vídeos em que estavas inteiramente
nua, e razoavelmente despenteada (a anos do Jorge, algo que também me dá prazer).
Olha, cada vez que os vejo chamo-te Alzira,
Parva, e profissões que não passariam na alfândega.
Que o sol te seja breve, que envelheças muito, e te cresçam palitos,
raios e coriscos (e que o Jorge não tenha sorte, antes, durante e depois).
Se sabias que não ia levar a bem, como me pudeste deixar?
Tanta coisa que investi em ti, Alzira, tantos trocos...
Uma vez até disse que te amava, o que não
vai com a minha tradição de fazer o mundo.
A minha vingança, Alzira, o meu triunfo,
é rasgar o alfabeto, a língua, deixar-te à espera
do que podia (daqui à Zâmbia).
Espero que em cada esquina suspeites da minha ternura,
e te faça falta.
Rui A.