Virgílio não nos diz que os aqueus aproveitaram os intervalos de escuridão para entrar em Troia; fala dos amistosos silêncios da Lua. Não escreve que Troia foi destruída; diz “Troia foi”. Não escreve que um destino foi infeliz; escreve: “De outra maneira o entenderam os deuses”. Para expressar aquilo que agora se chama panteísmo deixa-nos estas palavras: “Todas as coisas estão cheias de Júpiter”. Virgílio não condena a loucura bélica dos homens; diz “o amor do ferro”. Não nos conta que Eneias e Sibila erravam solitários sob a escura noite; escreve: “Ibant obscuri sola sub nocte per umbram!
Não se trata, certamente, de uma mera figura de retórica, do hipérbato: solitários e escura não mudaram o seu lugar na frase; as duas formas, a habitual e a virgiliana, correspondem com igual precisão à cena que representam.

Jorges Luis Borges, trad. Cristina Rodriguez e Artur Guerra