Modus vivendi

"bene senescere sine timore nec spe"

blogue de Ana Roque

Arquivo de agosto 2020


31 de Agosto de 2020

a poesia autêntica

É típico da poesia autêntica, da que não é evasiva, não ter por onde se pegue para fugirmos à consciência, à lucidez, à crua luz da verdade moral.

Jorge de Sena


31 de Agosto de 2020

Hughie Lee-Smith

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30 de Agosto de 2020

A poesia é um gozo

A poesia é um gozo
um uso sabido
do erro errado

A poesia é um gozo
e se o não é
a culpa é do vizinho do lado

A poesia é um gozo
de palavras paralelas
daquelas
que não há

A poesia é um gozo
como um osso encravado

A poesia é um gozo
o leitor
deve sentir-se gozado

E. M. de Melo e Castro


29 de Agosto de 2020

François Gérard

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29 de Agosto de 2020

A Mulher Nua

Humana fonte bela,
repuxo de delícia entre as coisas,
terna, suave água redonda,
mulher nua: um dia,
deixarei de te ver,
e terás de ficar
sem estes assombrados olhos meus,
que completavam tua beleza plena,
com a insaciável plenitude do seu olhar?
(Estios; verdes frondas,
águas entre as flores,
luas alegres sobre o corpo,
calor e amor, mulher nua!)
Limite exacto da vida,
perfeito continente,
harmonia formada, único fim,
definição real da beleza,
mulher nua: um dia,
quebrar-se-á a minha linha de homem,
terei que difundir-me
na natureza abstracta;
não serei nada para ti,
árvore universal de folhas perenes,
concreta eternidade!

Juan Ramón Jiménez, trad. José Bento


28 de Agosto de 2020

Nikias Skapinakis

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27 de Agosto de 2020

Sem amor

Viver sem amor
É como não ter para onde ir
Em nenhum lugar
Encontrar casa ou mundo
É contemplar o não-acontecer
O lugar onde tudo já não é
Onde tudo se transforma
No recinto
De onde tudo se mudou
Sem amor andamos errantes
De nós mesmos desconhecidos
Descobrimos que nunca se tem ninguém
Além de nós próprios
E nem isso se tem

Ana Hatherly


26 de Agosto de 2020

Há um deus único e secreto

Há um deus único e secreto
em cada gato inconcreto
governando um mundo efémero
onde estamos de passagem
Um deus que nos hospeda
nos seus vastos aposentos
de nervos, ausências, pressentimentos,
e de longe nos observa
Somos intrusos, bárbaros amigáveis,
e compassivo o deus
permite que o sirvamos
e a ilusão de que o tocamos

Manuel António Pina


25 de Agosto de 2020

Nicolas Lancret

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25 de Agosto de 2020

As Causas

Todas as gerações e os poentes.
Os dias e nenhum foi o primeiro.
A frescura da água na garganta
De Adão. O ordenado Paraíso.
O olho decifrando a maior treva.
O amor dos lobos ao raiar da alba.
A palavra. O hexâmetro. Os espelhos.
A Torre de Babel e a soberba.
A lua que os Caldeus observaram.
As areias inúmeras do Ganges.
Chuang Tzu e a borboleta que o sonhou.
As maçãs feitas de ouro que há nas ilhas.
Os passos do errante labirinto.
O infinito linho de Penélope.
O tempo circular, o dos estóicos.
A moeda na boca de quem morre.
O peso de uma espada na balança.
Cada vã gota de água na clepsidra.
As águias e os fastos, as legiões.
Na manhã de Farsália Júlio César.
A penumbra das cruzes sobre a terra.
O xadrez e a álgebra dos Persas.
Os vestígios das longas migrações.
A conquista de reinos pela espada.
A bússola incessante. O mar aberto.
O eco do relógio na memória.
O rei que pelo gume é justiçado.
O incalculável pó que foi exércitos.
A voz do rouxinol da Dinamarca.
A escrupulosa linha do calígrafo.
O rosto do suicida visto ao espelho.
O ás do batoteiro. O ávido ouro.
As formas de uma nuvem no deserto.
Cada arabesco do caleidoscópio.
Cada remorso e também cada lágrima.
Foram precisas todas essas coisas
Para que um dia as nossas mãos se unissem.


Jorge Luis Borges, trad. Fernando Pinto do Amaral


24 de Agosto de 2020

Bondade

Sobre a bondade. Reflexo espelhado
                              do tempo: roubo
                              o espaço e o detenho
                              à frente do espectro:
                              esperto agente gentios
                              expostos gêmeos
                              separados no aporte
                              do barco ao porto: deslizo
                              remos em águas
                              de malefícios: o mal estar
                              da bondade na fronte franzida
                              por estar sozinho na gravidade
                              da presença reposta ao ato.

Pedro Du Bois


23 de Agosto de 2020

Thomas Eakins

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23 de Agosto de 2020

Sometimes

Sometimes
if you move carefully
through the forest,
breathing
like the ones
in the old stories,
who could cross
a shimmering bed of leaves
without a sound,
you come to a place
whose only task
is to trouble you
with tiny
but frightening requests,
conceived out of nowhere
but in this place
beginning to lead everywhere.
Requests to stop what
you are doing right now,
and
to stop what you
are becoming
while you do it,
questions
that can make
or unmake
a life,
questions
that have patiently
waited for you,
questions
that have no right
to go away.

David Whyte


22 de Agosto de 2020

Da matéria

O amor cerra os olhos, não para ver mas para absorver: a obscura transparência, a espessura das sombras ligeiras, a ondulação ardente: a alegria. Um cavalo corre na lenta velocidade das artérias. O amor conhece-se sobre a terra coroada: animal das águas, animal do fogo, animal do ar: a matéria é só uma, terrestre e divina.

António Ramos Rosa


21 de Agosto de 2020

Margaret C. Cook

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21 de Agosto de 2020

A Felicidade é um Túnel

o domínio
o erotismo do domínio
                 do domínio irrisório
                                   mas enorme

submeter
ver tremer
ver o tremor do outro

               vencer
                       o gelo
                       o desdém
                                  veloz

a felicidade é um túnel

Ana Hatherly


20 de Agosto de 2020

Inês Gato

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20 de Agosto de 2020

Cultura e neuropoder

Neuropoder é uma forma de conhecimento produzido pelo poder tecnológico em aliança com o poder político, que actua por meio da modulação de processos mentais, funções e expressões, dirigido a indivíduos e a agregados populacionais. Por meio de imagens cerebrais, tratamentos médicos e farmacologia, extensões técnicas, redes digitais, regimes jurídicos e paradigmas conceptuais orientadores, o neuropoder actua nas funções mentais que antes eram invisíveis, ignoradas ou ingovernáveis. O neuropoder é uma lógica capacitadora de uma governamentalidade que vê na regulação da cognição, da sensação, da atenção, do humor e da aptidão mental, um novo e singular território de influência e soberania.

Rui Matoso


20 de Agosto de 2020

Alexander Archipenko

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20 de Agosto de 2020

Do vinho

Habilidades literárias, ou da potencialidade de um vinho branco

Reconheço, a contragosto, as virtudes do vinho branco:
A casa não ficou mais pequena, antes pelo contrário;
e não me senti mais só, nem menos amado.

Alentejano, o pingo, e recomendado para
"pratos de peixe no forno ou estufados, carnes brancas, queijo";
acompanho a cigarro e merece, tem muito de engraçado:
A fintar com arte e a preço proletário
pontuações, insuficiências e ardis, ao quinto copo.

Dizendo, no fundo dos fundos, o que não deve ser dito:
as maiores das inconveniências, talvez e por sopuesto;

Fica, ao sexto ou nono dos recipientes,
o privilégio, a sorte (alguma alegria, quase)
de qualquer coisa que não sei
dizer.

Enfim, habilidades literárias.

O tinto mais me anima, manifestamente indiferente,
e pode ser que amanhã.

Rui A.


19 de Agosto de 2020

John Lavery

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19 de Agosto de 2020

Do pão

O pão que repartimos
é mais que o pão: alimento
diário por estarmos juntos
no tormento de limparmos
do chão os farelos

estar contigo é o pão
repartido: farelos caídos
e cascas em pedaços

contigo o pão se transubstancia
em nós e nos alimentamos
um do outro

retiramos as cascas
e nos esfarelamos
ao solo.

Pedro Du Bois


18 de Agosto de 2020

Edward Hopper

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18 de Agosto de 2020

Aqui

Aqui, onde a mão não
alcança o interruptor da vida, aqui
só brilha a solidão.
Desfazem-se as lembranças contra os vidros.
Aqui, onde a brancura
dum lenço é a brancura do infortúnio,
aqui a solidão
não brilha, apenas
se estorce.
A fome fala através das feridas.

Luís Miguel Nava


17 de Agosto de 2020

A noite

Um verso
como a lâmina
um gesto
como o vento
uma palavra
como o silêncio
um rosto
como o horizonte
um olhar
como um relâmpago
para iluminar
a noite

Rui Prates Esteves


17 de Agosto de 2020

Paulo Querido

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17 de Agosto de 2020

Decisões

O namorado dá
flores murchas
à namorada
e a namorada come as flores
porque tem fome
Não trocam cartas
nem retratos nem anéis
porque são pobres
Mas um dia
têm muito medo
de se esquecerem
um do outro
então apanham
um cordel
do chão
cortam o cordel
e trocam alianças
feitas de cordel
Não podem
combinar encontros
porque não têm
número de telefone
nem morada
assim encontram-se
por acaso
e têm medo
de não se voltarem
a encontrar
O acaso
não os favorece
Decidem nunca sair
do mesmo sítio
e ficarem sempre juntos
para não se perderem
um do outro

Adília Lopes


16 de Agosto de 2020

Nascer Todas as Manhãs

Apesar da idade, não me acostumar à vida. Vivê-la até ao derradeiro suspiro de credo na boca. Sempre pela primeira vez, com a mesma apetência, o mesmo espanto, a mesma aflição. Não consentir que ela se banalize nos sentidos e no entendimento. Esquecer em cada poente o do dia anterior. Saborear os frutos do quotidiano sem ter o gosto deles na memória. Nascer todas as manhãs.

Miguel Torga


15 de Agosto de 2020

Ericeira

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15 de Agosto de 2020

Futuro

Ausculto: o oráculo desdiz a previsão
de ontem: renova as esperanças
em cartas jogadas sobre o pano
(sujo pano de antevisões)

oculto o sentido e repito a pergunta
: o horóscopo traduzido em signos
  reafirma a cantilena antiga
  dos desprezos

(sujos desprezos escondem a sorte)
retruco: sendo meu futuro obscuro
espaço vago não lamento
a história antecipada.

Pedro Du Bois


13 de Agosto de 2020

Amigo, a que vieste?

Onde foste ao bater das quatro horas
e, antes, quem eras tu, se eras?
Amigo ou inimigo, posso falar-te agora
sentado à minha frente e com os ombros
vergados ao peso da caneta?
Falo-te sobre a cabeça baixa
e vejo para além de ti, no horizonte,
teus riscos e passadas;
mas não sei onde foste, nem se eras.
Olho-te ao fundo, sob o sol e a chuva,
fazendo gestos largos ou só um leve aceno;
dizes palavras antigas,
de antes das quatro horas,
e nada sei de ti que tu me digas
dessa cabeça surda.
Não te pergunto pela verdade,
que pensas de amanhã ou se já leste Goethe;
sequer se amaste ou amas
misteriosamente
uma mulher, um peixe, uma papoila.
Não quero essa mudez de condolências
a mim, a ti, ou só à terra
que tu e eu pisamos -- e comemos.
Pergunto simplesmente se tu eras,
quem eras, e onde foste
depois que se fizeram quatro horas.
Será que não tens olhos? Não tos vejo.
De longe em longe
agitas a cabeça, mas talvez seja engano.
Palavra, não te entendo.
Amigo, a que vieste?

Pedro Tamen


13 de Agosto de 2020

é noite ainda

pernoitas em mim
e se por acaso te toco a memória... amas
ou finges morrer
pressinto o aroma luminoso dos fogos
escuto o rumor da terra molhada
a fala queimada das estrelas
é noite ainda
o corpo ausente instala-se vagarosamente
envelheço com a nómada solidão das aves
já não possuo a brancura oculta das palavras
e nenhum lume irrompe para beberes

Al Berto


12 de Agosto de 2020

Thomas Eakins

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12 de Agosto de 2020

No último desfiladeiro

A terra nos é estreita. Ela nos encurrala no último desfiladeiro
E nós nos despimos dos membros
Para passar.
A terra nos espreme. Fôssemos nós o seu trigo para morrer e ressuscitar.
Fosse ela a nossa mãe para se compadecer de nós.
Fôssemos nós as imagens dos rochedos
que o nosso sonho levará como espelhos.
Vimos o rosto de quem, na derradeira defesa da alma,
o último de nós matará.
Choramos pela festa dos seus filhos e vimos o rosto
Dos que despenham nossos filhos pela janela deste último espaço.
Espelhos que a nossa estrela polirá.
Para onde irmos após a última fronteira?
Para onde voarão os pássaros após o último céu?
Onde dormirão as plantas após o último vento?
Escreveremos nossos nomes com vapor
carmim, cortaremos a mão do canto para que nossa carne o complete.
Aqui morreremos. No último desfiladeiro.
Aqui ou aqui... plantará oliveiras
Nosso sangue.

Mahmud Darwish, trad. Paulo Farah


11 de Agosto de 2020

Kandinsky

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11 de Agosto de 2020

A sereia das pernas tortas

Era uma vez uma mulher que tão depressa era feia como era bonita.
Quando era bonita, as pessoas diziam-lhe:
- Eu amo-te.
E iam com ela para a cama e para a mesa.
Quando era feia, as mesmas pessoas diziam-lhe:
- Não gosto de ti.
E atiravam-lhe com caroços de azeitona à cabeça.
A mulher pediu a Deus:
- Faz-me ou bonita ou feia de uma vez por todas e para sempre.
Então Deus fê-la feia.
A mulher chorou muito porque estava sempre a apanhar com caroços de azeitona e a ouvir coisas feias. Só os animais gostavam sempre dela, tanto quando era bonita como quando era feia como agora que era sempre feia. Mas o amor dos animais não lhe chegava. Por isso deitou-se a um poço. No poço, estava um peixe que comeu a mulher de um trago só, sem a mastigar.
Logo a seguir, passou pelo poço o criado do rei, que pescou o peixe.
Na cozinha do palácio, as criadas, a arranjarem o peixe, descobriram a mulher dentro do peixe. Como o peixe comeu a mulher mal a mulher se matou e o criado pescou o peixe mal o peixe comeu a mulher e as criadas abriram o peixe mal o peixe foi pescado pelo criado, a mulher não morreu e o peixe morreu.
As criadas e o rei eram muito bonitos. E a mulher ali era tão feia que não era feia. Por isso, quando as criadas foram chamar o rei e o rei entrou na cozinha e viu a mulher, o rei apaixonou-se pela mulher.
- Será uma sereia? - perguntaram em coro as criadas ao rei.
- Não, não é uma sereia porque tem duas pernas, muito tortas, uma mais curta do que a outra. - respondeu o rei às criadas.
E o rei convidou a mulher para jantar.
Ao jantar o rei e a mulher comeram o peixe. O rei disse à mulher quando as criadas se foram embora:
- Eu amo-te.
Quando o rei disse isto, sorriu à mulher e atirou-lhe com uma azeitona inteira à cabeça. A mulher apanhou a azeitona e comeu-a. Mas, antes de comer a azeitona, a mulher disse ao rei:
- Eu amo-te.
Depois comeu a azeitona. E casaram-se logo a seguir no tapete de Arraiolos da casa de jantar.

Adília Lopes


10 de Agosto de 2020

Da (falta de) memória

Fluidity of memory and a capacity to forget is perhaps the most haunting trait of our species. As history confirms, it allows us to come to terms with any degree of social, moral, or environmental degradation.

Wade Davis


10 de Agosto de 2020

Silêncio

O verdadeiro silêncio está dentro do mar.

Rui Prates Esteves


9 de Agosto de 2020

Jean-Pierre Weill

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9 de Agosto de 2020

O direito à cidade

O direito à cidade é muito mais que a liberdade individual de ter acesso aos recursos urbanos: é um direito de mudar a nós mesmos, mudando a cidade. Além disso, é um direito colectivo e não individual, já que essa transformação depende do exercício de um poder colectivo para remodelar os processos de urbanização. A liberdade de fazer e refazer as nossas cidades e a nós mesmos é, a meu ver, um dos nossos direitos humanos mais preciosos e ao mesmo tempo mais negligenciados.

David Harvey


9 de Agosto de 2020

Da pose

em pose
o carvalho
não olha para as flores

Matsuo Bashô


8 de Agosto de 2020

Thomas Eakins

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8 de Agosto de 2020

Regresso a Um Cenário Campestre

Leio ovídio para te cantar; evoco
a ilíada para te raptar; demoro-me
pela bíblia, quando salomão
se embriaga com os lábios da amada,
para sentir a tua pele; e abro o livro
dos teus lábios onde se imprimem
os teus murmúrios, ouvindo-os
cair numa taça de versos. Passo
cada página com os dedos abertos
da mão que folheia as páginas
que me dás, demorando-me
em cada linha e em cada sílaba,
sem querer chegar ao fim. E
dás-me o teu sorriso,
a branca colina dos teus seios,
um desaguar de desejo
no estuário das tuas coxas, lenta
e ágil como as aves da primavera.

Nuno Júdice


7 de Agosto de 2020

Jacques-Louis David

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7 de Agosto de 2020

Encerrar

Encerro o riso
entorno o pão
esfarelo o vinho

gotas despossuídas
cercam o pano
deixam marcas

destampo a vasilha
e o cheiro realimenta
o instinto: do que sou feito
                 ressurge a ideia
                 primitiva no pão
                 e no vinho
     de tingido espírito.

Pedro Du Bois


6 de Agosto de 2020

Cristal

Não procura nos meus lábios tua boca,
não diante da porta o forasteiro,
não no olho a lágrima.    
Sete noites acima caminha o vermelho ao vermelho,
sete corações abaixo bate a mão à porta,
sete rosas mais tarde rumoreja a fonte.

Paul Célan, trad. Claudia Cavalcanti


4 de Agosto de 2020

Thomas Eakins

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4 de Agosto de 2020

Não a luz

Não a luz que se extinguiu para nós, nem as acções que passaram,

Nem os dias de outrora,

Nem as tristezas não tristes, nem o rosto mais justo

De enaltecimento perfeito

T.E. Lawrence


3 de Agosto de 2020

Thomas Eakins

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3 de Agosto de 2020

De perto

Escrevo-te de perto, como se a mão
te fosse objecto breve aflorado,
como se da rua te chegasse
a certeza pequena para a compra
dos minutos seguintes. De perto
como o sol, como a cigarra.
Como um silêncio cheio
que te viesse aos olhos de manhã
e amar-te fosse a roupa
escolhida ao começar o dia.

Pedro Tamen


2 de Agosto de 2020

e ainda

Ser no engano
desengano: a hora do tempo
desmedido dos andares.

Ter estado aqui em outro estado.
Cortar passagem entre o povo
impensável da espera

Saber do fim aproximado e rasgar
em versos o sofrimento acobertado
da esperança: desenganar  a imagem
empobrecida das águas turvadas
em cada dia. Adiar a sensação
convincente das emendas
e buscar em frestas o erro
percebido: estar aqui agora
                    e ainda.

Pedro Du Bois


2 de Agosto de 2020

Thomas Eakins

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2 de Agosto de 2020

Liminal words

Each that we lose takes part of us;
A crescent still abides,
Which like the moon, some turbid night,
Is summoned by the tides.

Emily Dickinson


1 de Agosto de 2020

Na Terra Somos Brevemente Magníficos

Há experiências de vida fora da linguagem escrita, do texto. Vejo-me enquanto um visitante a tentar apanhar o que conseguir do léxico, das nuances, da vida de uma língua, a viajar por novas palavras. Isso é inspirador e também me assusta.

Ocean Vuong


1 de Agosto de 2020

Kay Sage

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1 de Agosto de 2020

Repouso

Estou olhando os frutos repousados
e as pequenas sombras alongadas
sobre a mesa de madeira e pedra.
A brisa entra por uma porta antiga.
Uma pétala branca cai de uma flor branca.
Sou, mais do que sou, estou
na perfeição das coisas que me envolvem.
Repouso na sinuosa exactidão.

António Ramos Rosa