Reflexões bucólicas II (Missão quase
Reflexões bucólicas II
(Missão quase impossível)
O ideal, tão longínquo quanto motivador: “Ser como o promontório contra o qual batem as ondas sem interrupção, que se mantém firme e em volta do qual adormece a espuma das vagas”. A sabedoria de Marco Aurélio é maior do que a mera erudição e consubstancia um modus vivendi quase impossível nos dias de hoje, onde a ataraxia se torna uma quimera improvável; como pergunta Savater, “como podemos aspirar nós a esta autonomia apática, nós, rebentos românticos da epilepsia cristã, do delírio historicista do progresso e da cega apetência psicanalítica?” (in Sobre Viver, ed. Teorema). A única resposta possível é dada ainda por Marco Aurélio: temos que afastar as causas mais comuns de perturbação, procurar a apatia (no sentido de ausência de pathos,) possível. Como? Antes de mais, reconhecendo que a maior parte do que nos acontece já aconteceu antes e vai continuar depois: “Tudo o que nos acontece é tão habitual e bem conhecido como a rosa na primavera e os frutos no Verão; algo parecido acontece com a doença, a morte, a difamação, a conspiração e tudo o que alegra ou aflige os néscios”.
Assim, aceitando a vida com naturalidade, controlando o medo e o desejo (já que eliminá-los é tarefa maior do que as forças do comum dos mortais permitem realizar...), pode vislumbrar-se o caminho para o equilíbrio e a serenidade.
Ana Roque
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Publicado em 27 de Agosto de 2003