(agradeço ao remetente, sem o mencionar, como prefere) Na minha bicicleta de recados eu vou pelos caminhos. Pedalo nas palavras atravesso as cidades bato às portas das casas e vêm homens espantados ouvir o meu recado ouvir minha canção. Na minha bicicleta de recados eu vou pelos caminhos. Vem gente para a rua a ver a novidade como se fosse a chegada do João que foi à Índia e era o moço mais galante que havia nas redondezas. Eu não sou o João que foi à Índia mas trago todos os soldados que partiram e as cartas que não escreveram e as saudades que tiveram na minha bicicleta de recados atravessando a madrugada dos poemas. Desde o Minho ao Algarve eu vou pelos caminhos. E vêm homens perguntar se houve milagre perguntam pela chuva que já tarda perguntam pelos filhos que foram à guerra perguntam pelo sol perguntam pela vida e vêm homens espantados às janelas ouvir o meu recado ouvir minha canção. Porque eu trago notícias de todos os filhos eu trago a chuva e o sol e a promessa dos trigos e um cesto carregado de vindima eu trago a vida na minha bicicleta de recados atravessando a madrugada dos poemas. Manuel Alegre