Modus vivendi

"bene senescere sine timore nec spe"

blogue de Ana Roque

Arquivo de setembro 2007


30 de Setembro de 2007

Redondel

O coração se acrescenta ao coração se acrescenta a outro e senta sob a árvore - tudo tão nuvem entre um coração e outro - redondos os sins, os vãos, a noite na concha do coração, o pampa e os corações sentados e um coração voando. Mudando, tudo é possível recomeçar. Carlos Nejar


30 de Setembro de 2007

Corbis-Bettman

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30 de Setembro de 2007

Abandonei-me ao vento

Abandonei-me ao vento. Quem sou, pode explicar-te o vento que me invade. E já perdi o nome ao som da morte, ganhei um outro livre, que me sabe quando me levantar e o corpo solte o meu despojo vão. Em toda parte o vento há-de soprar, onde não cabe a morte mais. A morte a morte explode. E os seus fragmentos caem na viração e o que ela foi na pedra se consome. Abandonei-me ao vento como um grão. Sem a opressão dos ganhos, utensílio, abandonei-me. E assim fiquei conciso, eterno. Mas o amor guardou meu nome. Carlos Nejar


30 de Setembro de 2007

Carlo Socrate

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30 de Setembro de 2007

O grande rio

Entre ti e o grande rio, um secreto dicionário. Com suas palavras-árvore, com suas palavras-pássaro, com suas palavras-pórtico, com suas palavras-lótus. Entre ti e o grande rio, as léguas de um estuário. Onde florescem os álamos, onde adormecem os pântanos, onde se tecem os cânticos, onde fenecem as pátinas. Entre ti e o grande rio, Há um secreto calendário. As horas de tuas lágrimas, as horas enchendo cântaros, as horas colhendo lâminas as horas de teus átrios. Entre ti e o grande rio, há um tecido visionário. Com que se cosem as túnicas para os mais secretos ritos: raízes das noites únicas, húmus que alimentam mitos. Carlos Augusto Viana


29 de Setembro de 2007

Figos verdes

guitarras flamencas tocam no verniz de pires brancos servidos figos verdes e creme folhas de menta cavalgam o colo de insetos notívagos entre as romãs de rubra semente que seriam azuis em outra ocasião romãs e figos maduros são sexos femininos tomados de carinhos extremos se desmancham em gotas de deleite ao calor tórrido dos trópicos Edson Bueno de Camargo


29 de Setembro de 2007

Niña morena y ágil

Niña morena y ágil, el sol que hace las frutas, el que cuaja los trigos, el que tuerce las algas, hizo tu cuerpo alegre, tus luminosos ojos y tu boca que tiene la sonrisa del agua. Un sol negro y ansioso se te arrolla en las hebras de la negra melena, cuando estiras los brazos. Tú juegas con el sol como con un estero y él te deja en los ojos dos oscuros remansos. Niña morena y ágil, nada hacia ti me acerca. Todo de ti me aleja, como del mediodía. Eres la delirante juventud de la abeja, la embriaguez de la ola, la fuerza de la espiga. Mi corazón sombrío te busca, sin embargo, y amo tu cuerpo alegre, tu voz suelta y delgada. Mariposa morena dulce y definitiva como el trigal y el sol, la amapola y el agua. Pablo Neruda


29 de Setembro de 2007

Dúvida

Amor a tua voz e a minha sensação de vácuo de liberdades paralelas ontem esquinas encontradas no ângulo dos lábios Amor a tua lâmpada de nevoeiro sulcado manhãs de aves súbitas com noites inventadas nada é o teu rosto insectos de vertigem sem paisagem. Maria Teresa Horta


29 de Setembro de 2007

Camillo Innocenti

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29 de Setembro de 2007

Como quem acende um fogo

Para arder no lume da intensa doçura é preciso desviar a palavra do seu alvo redondo e balbuciar vacilando em verdes veredas o som vegetal da nua imperfeição Se as consoantes rangem com uma matéria espessa se as vogais oscilam como se fossem de água é porque de algum modo é a terra que vibra e quanto mais áspero é o movimento das sílabas mais se toca o osso do discurso na sua indolente violência Como quem acende um fogo com ramos entre pedras e o sopra lentamente para que a chama se eleve assim os materiais do poema têm a natural secura da matéria inerte e gasta e que no entanto se inflama para que possamos arder no lume da intensa doçura e consagrar o que ainda resta do primitivo fogo para que o mundo avançando retorne ao seu princípio António Ramos Rosa


29 de Setembro de 2007

Arte poética

Vai pois, poema, procura a voz literal que desocultamente fala sob tanta literatura. Se a escutares, porém, tapa os ouvidos, porque pela primeira vez estás sozinho. Regressa então, se puderes, pelo caminho das interpretações e dos sentidos. Mas não olhes para trás, não olhes para trás, ou jamais te perderás; e teu canto, insensato, será feito só de melancolia e de despeito. E de discórdia. E todavia sob tanto passado insepulto o que encontraste senão tumulto, senão de novo ressentimento e ironia? Manuel António Pina


28 de Setembro de 2007

Carta dos Trabalhos do Olhar

(gentileza de Amélia Pais) do outro lado das palavras os ramos altos das figueiras a misturar o tempo com restos de casas abandonadas levanto as mãos no meu sonho e uma ferida de água nas pontas dos dedos durará aqui como um beijo imaginado lembrando correndo dormindo falo da outra face dos rios de coisas velozes como a terra onde dói um sorriso onde a noite se dobra nítida ao fervor das sementes onde o corpo adivinha essa cor rasgada nos lençóis depois olho-te em segredo respiro o que tu respiras escrevo essas palavras adormecidas no ar olho-te longe da minha insónia contemplo o horizonte quebrado dos montes o trigo o feno as estevas rio-me a sombra dos meus braços move-se junto aos gatos entre avencas e silenas fico imóvel atento onde começará este esquecimento? como será o meu silêncio no teu rosto? deita-te sobre mim vem escuta as árvores abrem-se ao meio nas ruas da vila nas pedras cansadas nas amoras junto ao sol dos muros vem não tenhas medo sou teu e também isto são pormenores vem era uma vez dois magos numa floresta Joaquim Cardoso Dias


28 de Setembro de 2007

As The Sparrow

To give life you must take life, and as our grief falls flat and hollow upon the billion-blooded sea I pass upon serious inward-breaking shoals rimmed with white-legged, white-bellied rotting creatures lengthily dead and rioting against surrounding scenes. Dear child, I only did to you what the sparrow did to you; I am old when it is fashionable to be young; I cry when it is fashionable to laugh. I hated you when it would have taken less courage to love. Charles Bukowski


28 de Setembro de 2007

Camillo Innocenti

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28 de Setembro de 2007

Tempus Fugit

O tempo começa quando nascem certas flores. O tempo denso de uma noite, o seu perfume, a sua ardência, de uma flor que não pode ver o dia. O tempo acaba quando morrem certas flores. O tempo evanescente de uma garoa: o seu afago, a sua frialdade, de uma flor que não pode ver a luz. O tempo é noite, é bruma: permanência do escuro entre as estrelas, uma passagem de arrepio entre calores. O tempo começa e o tempo acaba, tudo que dizemos sobre flores, rápidos, efêmeros, doentes; nossa mirada, uma miragem, resvala em jardim, de madrugada. Fernando Peres


28 de Setembro de 2007

Natureza viva

Gosto de sentir a natureza e fingir que não lhe pertenço. A mão gigante do vento vai sacudindo o carro contra o mar com grandes chapadas brancas. Não é o mundo que tenho na cabeça as gotas de água que embaciam o vidro e o véu da chuva o da noiva submissa. As palavras não querem ser irmãs das ondas e o meu silêncio não é filho desta tempestade. Mas como é belo que tudo viva na luta de viver. A fúria da maré no espelho do meu rosto como um poema de Pedro Homem de Mello. O som mais natural dá-me a nitidez dos choros suicidas e transporta no tempo esse luxo dos homens que se chama esperança. No céu baila e divaga mais uma gaivota. No chão perto do mar outro baile circunda o coração. Mas nunca saberei como se dança. Armando Silva Carvalho


28 de Setembro de 2007

Menzio

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27 de Setembro de 2007

Da mudança

Tudo aquilo que não me mude para sempre não merece ser chamado amor. Richard Zimler, in A Sétima Porta.


27 de Setembro de 2007

Mãos astutas de princesa

Debaixo do colchão tenho guardado o coração mais limpo desta terra como um peixe lavado pela água da chuva que me alaga interiormente Acordo cada dia com um corpo que não aquele com que me deitei e nunca sei ao certo se sou hoje o projecto ou memória do que fui Abraço os braços fortes mas exactos que à noite me levaram onde estou e, bebendo café, leio nas folhas das árvores do parque o tempo que fará Depois irei ali além das pontes vender, comprar, trocar, a vida toda acesa; mas com cuidado, para não ferir as minhas mãos astutas de princesa. António Franco Alexandre


27 de Setembro de 2007

Geórgicas

1 Uma apetência de lugar, acaso? Ou só o acaso de apetência alguma? E, depois disso, uma negrura de anos se abrindo a, cada vez, outra mais funda, talvez ciosa. E a esquivar, portanto, a idolatria que lhe configuram. Uma apetência virtual? Mas, que acto a inclina ao estrépito, à avidez que impugna para, de dentro do vazio, o espaço surdir do estrondo primordial – figura? Estrondo apenas? Ou vislumbrar-se o pacto na arcaica imensidade da cesura que se prolonga em já lugar de pasmo? Porque é o pasmo que, de facto, funda. Fernando Echevarría


27 de Setembro de 2007

Rosai

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27 de Setembro de 2007

O Poema Original

(gentileza de Amélia Pais) Original é o poeta que se origina a si mesmo que numa sílaba é seta noutra espasmo ou cataclismo o que se atira ao poema como se fosse ao abismo e faz um filho às palavras na cama do romantismo. Original é o poeta capaz de escrever em sismo. Original é o poeta de origem clara e comum que sendo de toda a parte não é de lugar algum. O que gera a própria arte na força de ser só um por todos a quem a sorte faz devorar em jejum. Original é o poeta que de todos for só um. Original é o poeta expulso do paraíso por saber compreender o que é o choro e o riso; aquele que desce à rua bebe copos quebra nozes e ferra em quem tem juízo versos brancos e ferozes. Original é o poeta que é gato de sete vozes. Original é o poeta que chega ao despudor de escrever todos os dias como se fizesse amor. Esse que despe a poesia como se fosse mulher e nela emprenha a alegria de ser um homem qualquer. Ary dos Santos


27 de Setembro de 2007

Tirinnanzi

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26 de Setembro de 2007

What Kisses Had John Keats?

I scanned two lines with some surmise As over Keats I chanced to pore: 'And there I shut her wild, wild eyes With kisses four.' Says I: 'Why was it only four, Not five or six or seven? I think I would have made it more,-- Even eleven. 'Gee! If she'd lured a guy like me Into her gelid grot I'd make that Belle Dame sans Merci Sure kiss a lot. 'Them poets have their little tricks; I think John counted kisses four, Not two or three or five or six To rhyme with "sore."' Robert Service


26 de Setembro de 2007

Camillo Innocenti

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26 de Setembro de 2007

The Instinct Of Hope

Is there another world for this frail dust To warm with life and be itself again? Something about me daily speaks there must, And why should instinct nourish hopes in vain? 'Tis nature's prophesy that such will be, And everything seems struggling to explain The close sealed volume of its mystery. Time wandering onward keeps its usual pace As seeming anxious of eternity, To meet that calm and find a resting place. E'en the small violet feels a future power And waits each year renewing blooms to bring, And surely man is no inferior flower To die unworthy of a second spring? John Clare


25 de Setembro de 2007

Francesco Menzio

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25 de Setembro de 2007

O Legado

Que não se percam nunca os dias construídos na fina argamassa de luz e cor. Nem se lamentem as águas que lavaram espantos Nem as agudas noites de sabor. Tudo correu bonito Em movimentos vivos de audaz transparência. A cidade nos deu presentes De sangue e canto De todo encanto. E lançamos aos ventos gritos sofreguidão ardências. Um pedaço de ti Guardei aqui para tatear na noite obscura e sentir esse jeito essa voz essa virtude altiva Paixão viva de eterno direito de amor e de nós. Juarez Leitão


25 de Setembro de 2007

Ao que deixei

Sinais da volta estive fora e por longo tempo afetado repleto de cosmo, na lua... Relâmpagos na reentrada errei a janela passeio sobre túmulos como uma bola flamejante consumido por dias e noite, ardil. ainda ouço meus gritos e os lamentos como se tivesse importância como se fosse ventre pé, cabeça, decepção como se necessário fosse lastimar as lágrimas escaldantes eu grito meu próprio julgamento são os sinais da volta. Roberto Gobatto


25 de Setembro de 2007

Meio dia, hoje

Fig%20da%20Foz%20relogio.jpg Foi bom ter visto a beleza deste areal, corrido por um vento fresco, sob o sol ainda doce do meio dia. Ter o mar em fundo, num verde atlântico tão diferente, na Foz do Mondego.


24 de Setembro de 2007

Sun-Flower

Ah Sun-flower! weary of time. Who countest the steps of the Sun; Seeking after that sweet golden clime Where the travellers journey is done. Where the Youth pined away with desire, And the pale Virgin shrouded in snow: Arise from their graves and aspire. Where my Sun-flower wishes to go. William Blake


24 de Setembro de 2007

Arietta settembrina

Ritornerà sul mare la dolcezza dei venti a schiuder le acque chiare nel verde delle correnti. Al porto sul veliero di carrube l' estate imbruna, resta nero il cane delle sassate. S' addorme la campagna di limoni e d' arena nel canto che si lagna monotono di pena. Così prossima al mondo dei gracili segni, tu riposi nel fondo della dolcezza che spegni. Alfonso Gatto


23 de Setembro de 2007

Tirinnanzi

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23 de Setembro de 2007

Mudanças de Nome

(gentileza de Amélia Pais) Aos amantes das belas letras Faço chegar os meus melhores desejos Vou mudar o nome de algumas coisas. A minha posição é esta: O poeta não cumpre a sua palavra Se não muda o nome das coisas. Com que razão o sol Há-de continuar a chamar-se sol? Peço que se lhe chame Micifuz O das botas de quarenta léguas! Os meus sapatos parecem ataúdes? Saibam que de hoje em diante Os sapatos chamam-se ataúdes. Comunique-se, anote-se e publique-se Que os sapatos mudaram de nome: A partir de agora chamam-se ataúdes. Bom, a noite é larga Todo o poeta que se estime a si mesmo Deve ter o seu próprio dicionário E antes que me esqueça Ao próprio deus há que mudar-lhe o nome Que cada qual o chame como quiser: Esse é um problema pessoal. Nicanor Parra, trad. de Henrique Manuel Bento Fialho


23 de Setembro de 2007

Derain

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23 de Setembro de 2007

Praise In Summer

Obscurely yet most surely called to praise, As sometimes summer calls us all, I said The hills are heavens full of branching ways Where star-nosed moles fly overhead the dead; I said the trees are mines in air, I said See how the sparrow burrows in the sky! And then I wondered why this mad instead Perverts our praise to uncreation, why Such savour's in this wrenching things awry. Does sense so stale that it must needs derange The world to know it?To a praiseful eye Should it not be enough of fresh and strange That trees grow green, and moles can course in clay, And sparrows sweep the ceiling of our day? Richard Wilbur


22 de Setembro de 2007

Quase equinócio

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22 de Setembro de 2007

Do Outono

Sem vento, a minha voz secou aqui, neste parque de cedros quietos. Tudo é como ontem era, mas a minha voz, na minha face, calou-se, porque só o vento me trazia a fala, vinda de algures, com notícias de alguém, indo para além, para outros ouvidos, num país. Fiama Hasse Pais Brandão


22 de Setembro de 2007

Breves palavras

Pedi uma carteira. Queria fazer lume deitar fumo da garganta e ficar só. Breves palavras de tabacaria. E mesmo aí fiquei a dever por falta de troco. Carlos Poças Falcão


21 de Setembro de 2007

Francalancia

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21 de Setembro de 2007

Livre imaginação

(gentileza de Amélia Pais) É porque ninguém me ouve e ninguém me vigia e ninguém me acolhe que a minha imaginação é livre e o meu espaço permanentemente novo Se algum deus habita este vazio é o deus do vazio um deus que perdeu a sua densidade enigmática e é apenas o espectro de uma radiografia branca Ergo como um insecto as frágeis antenas para o espaço Sinto a ébria lucidez da minha liberdade Posso dizer tudo porque a leveza é transparente porque reconheço os anéis do silêncio o leque de uma linguagem nova Na minha garganta abriu-se o poço do oásis e o vento da imaginação sublevou-se nas minhas veias Sei que habito as palavras com os meus lábios solares ou os seus lábios de noite É por elas que sinto o sabor do pão e da terra e vejo as cintilantes arcas das constelações Tudo é puramente imaginado tudo é prodigiosamente real Ninguém me segreda os nomes que irei dizer com a limpidez do sal ou duros e negros como a obsidiana Ninguém me impede que envolva num arco a cruel doçura de um sexo vermelho e puro Ninguém me proibe que me multiplique que me dilate para ser cada vez mais a floração do espaço na sua liberdade de ser cada vez mais espaço António Ramos Rosa


20 de Setembro de 2007

Carrà

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20 de Setembro de 2007

Chuva

A chuva alterou toda a paisagem. Novos charcos e folhas mais brilhantes um halo que custa a desvelar. São guarda-chuvas o que os homens abrem cafés despenteados por rumor de gabardinas. Mesmo com sapatos sou um cão à chuva e tenho os pés molhados como queria. Carlos Poças Falcão


19 de Setembro de 2007

Aquí te amo

Aquí te amo. En los oscuros pinos se desenreda el viento. Fosforece la luna sobre las aguas errantes. Andan días iguales persiguiéndose. Se desciñe la niebla en danzantes figuras. Una gaviota de plata se descuelga del ocaso. A veces una vela. Altas, altas estrellas. O la cruz negra de un barco. Solo. A veces amanezco, y hasta mi alma está húmeda. Suena, resuena el mar lejano. Este es un puerto. Aquí te amo. Aquí te amo y en vano te oculta el horizonte. Te estoy amando aún entre estas frías cosas. A veces van mis besos en esos barcos graves, que corren por el mar hacia donde no llegan. Ya me veo olvidado como estas viejas anclas. Son más tristes los muelles cuando atraca la tarde. Se fatiga mi vida inútilmente hambrienta. Amo lo que no tengo. Estás tú tan distante. Mi hastío forcejea con los lentos crepúsculos. Pero la noche llega y comienza a cantarme. La luna hace girar su rodaje de sueño. Me miran con tus ojos las estrellas más grandes. Y como yo te amo, los pinos en el viento, quieren cantar tu nombre con sus hojas de alambre. Pablo Neruda


19 de Setembro de 2007

Feuerbach

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19 de Setembro de 2007

Manhã

A manhã estática parada Entre o Tejo azul e a Torre branca Que branca e barroca sobe das águas Manhã acesa de silêncio e louvor Na breve primavera violenta Assim a minha vida que era calma De repente se tornou ânsia e saudade Mas a brisa da varanda é doce e suave Um pássaro canta porque alguém regou Sophia de Mello Breyner Andresen


19 de Setembro de 2007

As coisas simples

Num dia assim contemplar as nuvens ou enfrentar a morte: é isto que dizemos enquanto prometemos o dia da coragem. Mas o mais temível são as coisas simples: prazos terminados inúteis providências afectos que se pegam como nos invernos as constipações. Carlos Poças Falcão


18 de Setembro de 2007

Fable

The mountain and the squirrel Had a quarrel, And the former called the latter, "little prig": Bun replied, You are doubtless very big, But all sorts of things and weather Must be taken in together To make up a year, And a sphere. And I think it no disgrace To occupy my place. If I'm not so large as you, You are not so small as I, And not half so spry: I'll not deny you make A very pretty squirrel track; Talents differ; all is well and wisely put; If I cannot carry forests on my back, Neither can you crack a nut. Ralph Waldo Emerson


18 de Setembro de 2007

Feuerbach

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18 de Setembro de 2007

Well, I Have Lost You

Well, I have lost you; and I lost you fairly; In my own way, and with my full consent. Say what you will, kings in a tumbrel rarely Went to their deaths more proud than this one went. Some nights of apprehension and hot weeping I will confess; but that's permitted me; Day dried my eyes; I was not one for keeping Rubbed in a cage a wing that would be free. If I had loved you less or played you slyly I might have held you for a summer more, But at the cost of words I value highly, And no such summer as the one before. Should I outlive this anguish—and men do— I shall have only good to say of you. Edna St. Vincent Millay


17 de Setembro de 2007

Fuga

(gentileza de Amélia Pais) Não foi outro o nosso amor fugia tornava a voltar e trazia-nos uma pálpebra descida muito longínqua um sorriso marmóreo, perdido dentro da erva matutina uma concha bizarra explicá-la procurava insistentemente nossa alma. O nosso amor não foi outro tenteava quietamente entre as coisas em redor de nós para explicar porque não queremos morrer com tanta paixão. E se nos agarrámos a quadris e se abraçámos outras nucas com toda a nossa força e se unimos o nosso hálito com o hálito dessa pessoa e se fechámos os nossos olhos, não foi outro apenas este anseio mais profundo de nos agarrarmos dentro da fuga. Yorgos Seferis, trad. de Joaquim Manuel Magalhães e Nikos Pratisinis


16 de Setembro de 2007

Design

I found a dimpled spider, fat and white, On a white heal-all, holding up a moth Like a white piece of rigid satin cloth -- Assorted characters of death and blight Mixed ready to begin the morning right, Like the ingredients of a witches' broth -- A snow-drop spider, a flower like a froth, And dead wings carried like a paper kite. What had that flower to do with being white, The wayside blue and innocent heal-all? What brought the kindred spider to that height, Then steered the white moth thither in the night? What but design of darkness to appall?-- If design govern in a thing so small. Robert Frost


16 de Setembro de 2007

Guston

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16 de Setembro de 2007

isto é uma carta de amor

(gentileza de Amélia Pais) Mas não sei dizer-te que espécie de amor. As flores brotam do campo de golfe. Estou no carro a ouvir não sei O quê; o que é? Oiço . Aleluias, fortíssimo, Pianoforte, um forte de conhecimento, reconhecimento, Piano, leve, pianos em queda, Inofensivos. Como pude sentar-me à mesa contigo, se já saciada? Talvez quisesse só sentir a comida nos dentes. A soprano vira a página. A trompa. Escuta: Amen, amen. A Academia de Saint Martin in The Fields, O que está no campo, bolas de golfe? Sir Neville Mariner dirige, Dirigindo, Rua Mariner abaixo. Quando é que se abre a porta aberta? Há quanto tempo te conheço nesta vida de cão? Dirijo-me para sul; as luzes acompanham o ritmo. Há um bálsamo Há uma história que te quis contar Em Gilead o telhado está a arder Não haverá um bálsamo nos meus lábios A cor é de cena As luzes mudam Há um bálsamo Agarro-me de olhos fechados a uma ideia de ti Numa rede e o rádio sempre a tocar Há um bálsamo O retrato da Virgem Mãe de pé Aos pés da cruz, Rossini, Perto, escuta, existe, há um bálsamo há de pé uma virgem. Elizabeth Burns, trad. Graça Capinha


15 de Setembro de 2007

Bereft

Where had I heard this wind before Change like this to a deeper roar? What would it take my standing there for, Holding open a restive door, Looking down hill to a frothy shore? Summer was past and the day was past. Sombre clouds in the west were massed. Out on the porch's sagging floor, Leaves got up in a coil and hissed, Blindly striking at my knee and missed. Something sinister in the tone Told me my secret may be known: Word I was in the house alone Somehow must have gotten abroad, Word I was in my life alone, Word I had no one left but God. Robert Frost


15 de Setembro de 2007

Hopper

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15 de Setembro de 2007

Do partir e do voltar

Partir. Voltar. Outra vez partir e outra vez voltar, compõem somente um quadro natural do tentar-viver. Se mais, talvez, estranha sinfonia de aflitos pés buscando o tom da vida com riscos de não ouvi-lo. E assim, para uma existência machucada o sonho pode acabar numa única saída: esquecer roteiros e apagar paisagens... Luiz Nogueira Barros


15 de Setembro de 2007

Cais

Cais é oferta da alma na noite. Busca ao estertor cavo de navio em ânsia de atracação. Carlos Figueiredo


14 de Setembro de 2007

A fera

A fera que te fere te induz ao erro, ao ferro em brasa que marca o corte e deixa para sempre essa costura na pele. A fera que te fere tem o propósito da tarde, como se a tarde guardasse em temporal. A fera de teu guarda-roupa caminha antepassados nas fotografias, molduras antigas que cercam as almas. A fera que te fere não fere teu pensamento. Fere a fratura exposta, a ferida do silêncio. Álvaro Alves de Faria


14 de Setembro de 2007

De Chirico

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14 de Setembro de 2007

Zoológico

Não leio o poema como o azul dos olhos nem vejo as naves como a luz do ocaso nada transformará lágrimas em frutos nada redimirá as faces desbotadas. Pássaro apenas o bico inerte as pernas rotas os pés inchados O silêncio perturba meu silêncio nauta que se perdeu imobilizado pêndulo complexo sistema de horas e sons estagnados. Na gaveta do tempo guardei os sapatos de outrora o velho terno marrom passeia em conúbio com as manhãs sepultadas na poeira longínqua Ficou a pele riscada de luto o cimento categórico do presente A vontade de rir envelheceu Um dia alguém há de encontrar a fera e penetrando sua crespa geografia saberá que seus olhos ardem como brasas. Florisvaldo Mattos


13 de Setembro de 2007

Ratoeira

Podia marcar as incursões do sol por esta sala. Alimentar uma esperança solar. Mas as estações são indomáveis e uma casa é um jogo de janelas que se fecham. Mosca inerte nas vidraças laranja que apodrece sobre a mesa: eis os pequenos seres na ratoeira. Carlos Poças Falcão


13 de Setembro de 2007

Feuerbach

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13 de Setembro de 2007

Ecos

Habitando os cafés e refletindo as manhãs com restos da noite, ambientou-se ao não-ser, traçou a inexistência, ficou entre parênteses. Silente e absorto, refez os becos de um dia oco e pesado. Inquieto, alimentou-se de acasos: sorveu as praças, o cinza das chaminés e amargurou-se com o lamento pulverizado dos meninos da grande cidade. Chorou a salobra segunda-feira, feita de vagidos e tormentos. Desse modo, por muito tempo, passou a repetir as noites, nos olhos avulsos do esquálido cão, que cismara em perseguir. Um dia, ao tentar recompor sua história, morreu de esquecimento. Francisco Perna Filho


13 de Setembro de 2007

Desvarios

A faca é o sonho de voar. Asas como inspiração, Formam facas. Representa o impossível significa não viver pela contemplação representa quem já se feriu com o vazio e a inutilidade de cortar - vento. Francijési Firmino


12 de Setembro de 2007

Ludger tom Ring (o Jovem)

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12 de Setembro de 2007

Ser mais que feliz

Pensou então no outro De como serviriam no seu pêlo rente, no seu olhar de trespassar prisões, de rasgar barras, ou na sua cabeça tão perfeita, de orelhas muito breves, mas capazes de ouvir a mais fugaz das mais serpentes – como lhe serviriam essas asas Voar pelo céu todo e ser mais que feliz Ana Luísa Amaral


11 de Setembro de 2007

Feuerbach

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11 de Setembro de 2007

Descanso

(gentileza de Amélia Pais) Quando durmo, nada sinto, e em mal e bem indistinto nada posso conhecer: não sei aquilo que sou, nem o que fui, nem se vou saber o que devo ser. Pierre de Ronsard, trad. Vasco Graça Moura.


11 de Setembro de 2007

Away, Melancholy

Away, melancholy, Away with it, let it go. Are not the trees green, The earth as green? Does not the wind blow, Fire leap and the rivers flow? Away melancholy. The ant is busy He carrieth his meat, All things hurry To be eaten or eat. Away, melancholy. Man, too, hurries, Eats, couples, buries, He is an animal also With a hey ho melancholy, Away with it, let it go. Man of all creatures Is superlative (Away melancholy) He of all creatures alone Raiseth a stone (Away melancholy) Into the stone, the god Pours what he knows of good Calling, good, God. Away melancholy, let it go. Speak not to me of tears, Tyranny, pox, wars, Saying, Can God Stone of man's thoughts, be good? Say rather it is enough That the stuffed Stone of man's good, growing, By man's called God. Away, melancholy, let it go. Man aspires To good, To love Sighs; Beaten, corrupted, dying In his own blood lying Yet heaves up an eye above Cries, Love, love. It is his virtue needs explaining, Not his failing. Away, melancholy, Away with it, let it go. Stevie Smith


10 de Setembro de 2007

Sombras sem memória

Pequenos negócios, olhares lançados sem dilatação. Dedos a tocar mármores tão frios. Sombras sem memória de mesas de cafés. Tudo apagamentos – como um jornal esquece mais um dia. Carlos Poças Falcão


10 de Setembro de 2007

Prampolini

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10 de Setembro de 2007

O Silêncio dos Livros

"A escrita constitui um arquipélago na imensidade oceânica da oralidade humana." George Steiner


10 de Setembro de 2007

a pretty a day

a pretty a day (and every fades) is here and away (but born are maids to flower an hour in all,all) o yes to flower until so blithe a doer a wooer some limber and lithe some very fine mower a tall;tall some jerry so very (and nellie and fan) some handsomest harry (and sally and nan they tremble and cower so pale:pale) for betty was born to never say nay but lucy could learn and lily could pray and fewer were shyer than doll.doll e.e. cummings


10 de Setembro de 2007

Sem pensar

E sem pensar no que seria o vento a balouçar em ciprestes de sol, penetrou na primeira onda de luz Mas não ficou mais largo, nem melhor, nem com maior coragem de se dar Ana Luísa Amaral


9 de Setembro de 2007

Trombadori

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9 de Setembro de 2007

No cume da noite

Rompo o tempo com uma canção de bolero Persigo minhas presas como uma pantera faminta Saboreio a caça com total serenidade Converto meus anseios em fome saciada Renego as memórias ancestrais Venço o dia com o suor do meu cansaço Glorifico cada instante como sendo o último passo Concebo o mundo como um enigma decifrado Evoluo com a idade do calendário Experimento a insensatez da lúcida esperança Distraidamente chuto as pedras do caminho E desbravo horizontes com a minha peregrina jornada Fujo de mim e esqueço inúmeras verdades das sombras e das escuridões Uma ilusão alada Incorpora-se no meu coração Permaneço em repouso Um cheiro de ervas inebria o luar Escalo cumes para tocar as estrelas E finco minha bandeira na noite devassada. Ana Cristina Souto


8 de Setembro de 2007

Feitiço

A clarabóia dos seus olhos não esconde um sonho triste do outro lado da vidraça é como um tigre envolvido pela sombra de um caçador que nunca encontra sua caça. O circo inteiro já partiu de manhãzinha sem perceber toda a tristeza do felino a fera presa no jardim do seu vestido era o meu sonho de amor quando menino. Alguém de negro joga cartas sobre a mesa a um marinheiro de gravata azul marinho o rei de copas sai da carta e o tigre mata e o marinheiro se transforma em passarinho. Por muito tempo esse feitiço foi cumprido e vem de noite arranhar a sua porta como quem chora a perfeição desse destino meio felino, marinheiro, gaivota. Luis Manoel Siqueira


8 de Setembro de 2007

Fim de estação

Não sei como se adivinham tempestades. No fim de uma estação as borboletas morrem e o vento quebra em varandas altas. É por trás dos vidros que nos defendemos contra todas as surpresas. Morremos de antemão. E já sob trovoada assombra-nos o voo dos pássaros à chuva. Carlos Poças Falcão


8 de Setembro de 2007

Seurat

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8 de Setembro de 2007

Another Day

having the low down blues and going into a restraunt to eat. you sit at a table. the waitress smiles at you. she's dumpy. her ass is too big. she radiates kindess and symphaty. live with her 3 months and a man would no real agony. o.k., you'll tip her 15 percent. you order a turkey sandwich and a beer. the man at the table across from you has watery blue eyes and a head like an elephant. at a table further down are 3 men with very tiny heads and long necks like ostiches. they talk loudly of land development. why, you think, did I ever come in here when I have the low-down blues? then the the waitress comes back with the sandwich and she asks you if there will be anything else? and you tell her, no no, this will be fine. then somebody behind you laughs. it's a cork laugh filled with sand and broken glass. you begin eating the sandwhich. it's something. it's a minor, difficult, sensible action like composing a popular song to make a 14-year old weep. you order another beer. jesus,look at that guy his hands hang down almost to his knees and he's whistling. well, time to get out. pick up the bill. tip. go to the register. pay. pick up a toothpick. go out the door. your car is still there. and there are 3 men with heads and necks like ostriches all getting into one car. they each have a toothpick and now they are talking about women. they drive away first they drive away fast. they're best i guess. it's an unberably hot day. there's a first-stage smog alert. all the birds and plants are dead or dying. you start the engine. Charles Bukowski


7 de Setembro de 2007

Restos

Há um resto de noite pela rua Que se dissolve em bruma e madrugada. Há um resto de tédio inevitável Que se evola na tênue antemanhã. Há um resto de sonho em cada passo Que antes de ser se foi, já não existe. Há um resto de ontem nas calçadas Que foi dia de festa e fantasia. Há um resto de mim em toda a parte Que nunca pude ser inteiramente. Ildásio Tavares


7 de Setembro de 2007

Cúmplice

Queda-te em teu silêncio. Entre meus dedos, o tempo é mel perdido. Espero o tempo escrito no degredo. Tua face de marfim e medo tenho, a escutar a ti mesmo ouvido no meu peito. Guarda-me sob os lençóis das tuas pálpebras, quanto te recolho em fragmentos quanto assim de ti me acrescento, a render-me ao silêncio preciso aqui, onde só tu és possível. Gláucia Lemos


7 de Setembro de 2007

Dorazio

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6 de Setembro de 2007

And The Moon And The Stars And The World

Long walks at night-- that's what good for the soul: peeking into windows watching tired housewives trying to fight off their beer-maddened husbands. Charles Bukowski


6 de Setembro de 2007

Abismos

Os abismos que se cavam entre pessoas orgulhosas só muito dificilmente se preenchem. John Galsworthy, in Beyond


6 de Setembro de 2007

First Memory

Long ago, I was wounded. I lived to revenge myself against my father, not for what he was-- for what I was: from the beginning of time, in childhood, I thought that pain meant I was not loved. It meant I loved. Louise Glück


6 de Setembro de 2007

Bonnard

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6 de Setembro de 2007

Visitação

O meu olhar demorou mas por fim entreabriu o quadro emoldurado de luz e neblina onde galopam os alazões da longa e enluarada noite dos meus mortos. Por campos de outrora e pelos campos do meu sonho agora eles viajam e regressam num instante enquanto demoramos em sua falta. Luciano Maia


6 de Setembro de 2007

Shinsui

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6 de Setembro de 2007

Pressentimento

O amor de agora é o mesmo amor de outrora Em que concentro o espírito abstraído, Um sentimento que não tem sentido, Uma parte de mim que se evapora. Amor que me alimenta e me devora, E este pressentimento indefinido Que me causa a impressão de andar perdido Em busca de outrem pela vida afora. Assim percorro uma existência incerta Como quem sonha, noutro mundo acorda, E em sua treva um ser de luz desperta. E sinto, como o céu visto do inferno, Na vida que contenho mas transborda, Qualquer coisa de agora mas de eterno. Dante Milano


6 de Setembro de 2007

Souvenir

Just a rainy day or two In a windy tower, That was all I had of you— Saving half an hour. Marred by greeting passing groups In a cinder walk, Near some naked blackberry hoops Dim with purple chalk. I remember three or four Things you said in spite, And an ugly coat you wore, Plaided black and white. Just a rainy day or two And a bitter word. Why do I remember you As a singing bird? Edna St. Vincent Millay


5 de Setembro de 2007

Junto à praia

Junto à praia, estacou. Perguntando-se: entrar pelo mar dentro fá-lo-ia mais largo e generoso – ou era melhor roubar as asas desse e voar pelos céus Retraídas as garras, estacou Ana Luísa Amaral


5 de Setembro de 2007

Tancredi

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4 de Setembro de 2007

Inverno (adivinhado II)

Silêncio na noite, cobre-se a árvore de neve: amor invernou. Bernadete Soares


4 de Setembro de 2007

Inverno (adivinhado)

Tapete de folhas, assanhadas com o vento, passos pensativos. Bernard Waldman


4 de Setembro de 2007

Tosi

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4 de Setembro de 2007

Peregrinação e Catábase (excerto)

Após a noite e os brilhos, o imenso Sol irrompe sobre a água, a escorrer luz, que vem pelo túnel e ilumina os rostos. A sombra do barqueiro que lança a corda para o cais de luz, agora é um corpo claro quase translúcido como o de um novo Anjo. "Ó fonte desta vida, Sol de alba, imagem de próprio, luminescente", entoou o Peregrino, entre os peregrinos que desembarcam agora, ao fim da viagem, purificados no medo e no silêncio. Era no meio do século, quando a Terra girava entre o horror e a harmonia. Fiama Hasse Pais Brandão


4 de Setembro de 2007

Coral

É um dos corais de Leipzig, o quarto. Sem saber como, desceu ao chão da alma. A música é este abismo, esta queda no escuro. Com o nosso corpo tece a sua alegria, faz a claridade dos bosques com a nossa tristeza. Pela sua mão conhecemos a sede, o abandono, a morte. Mas também o êxtase de estrela em estrela. E a ressurreição. Eugénio de Andrade


3 de Setembro de 2007

Cassinari

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2 de Setembro de 2007

Dedicatória

Quando me tiveres apagado, morto ou só feito da matéria da memória, dança uma dança por nada e debruça em arco o teu corpo sobre o poço da morte sobre o corpo dividido e espalhado pela última praia Manuel Gusmão


2 de Setembro de 2007

Quase Outono

Sentado no Outono desta praia quase deserta vou contando os grãos de areia em volta, e tudo são grãos de areia onde se inscreve uma lava cada vez mais fria. As mãos na terra, o pensamento nas nuvens que derivam ao sabor do vento. Cada vez mais frio. O mesmo que agita os meus cabelos brancos. Casimiro de Brito


1 de Setembro de 2007

Desconcerto

Constatar que quem nos podia/devia conhecer razoavelmente afinal nos "treslê", se enreda em impressões equivocadas, imagina desagrados inexistentes, intui distância e má vontade onde havia proximidade autêntica - eis um desconcerto que a princípio revolta, mas cedo nada será além de um desconforto triste.


1 de Setembro de 2007

Cézanne

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1 de Setembro de 2007

Silente

Desencanto a voz. Uma atenção miúda faz daquele arbusto um feixe de absurdos. Narinas deste cão centrando um mundo e duas abelhas ali ao mesmo tempo: é isto que agora só interessa – atravessar o jardim pelo meio da cidade muito calado para entrar em casa. Carlos Poças Falcão


1 de Setembro de 2007

C'est en septembre

Les oliviers baissent les bras Les raisins rougissent du nez Et le sable est devenu froid Oh blanc soleil Maitres baigneurs et saisonniers Retournent à leurs vrais métiers Et les santons seront sculptés Avant Noël C'est en septembre Quand les voiliers sont dévoilés Et que la plage, tremblent sous l'ombre D'un automne débronzé C'est en septembre Que l'on peut vivre pour de vrai En été mon pays à moi En été c'est n'importe quoi Les caravanes le camping-gaz Au grand soleil La grande foire aux illusions Les slips trop courts, les shorts trop longs Les hollandaises et leurs melons De cavaillon C'est en septembre Quand l'été remet ses souliers Et que la plage est comme un ventre Que personne n'a touché C'est en septembre Que mon pays peut respirer Pays de mes jeunes années Là où mon père est enterré Mon école était chauffée Au grand soleil Au mois de mai, moi je m'en vais Et je te laisse aux étrangers Pour aller faire l'étranger moi-même Sous d'autres ciels Mais en septembre Quand je reviens où je suis né Et que ma plage me reconnaît Ouvre des bras de fiancée C'est en septembre Que je me fais la bonne année C'est en septembre Que je m'endors sous l'olivier Gilbert Bécaud & Maurice Vidalin